De unicórnio a camelo: entenda o novo cenário das startups – Tibério Praxar, da UNIMENTOR
Uma startup é uma empresa que busca resolver um problema de forma rápida, por meio de uma ideia inovadora. Nos últimos anos, vivemos uma explosão de startups; poucas, no entanto, alcançaram a marca de unicórnio, isto é, que alcança uma avaliação de mercado de mais de 1 bilhão de dólares.
Uma startup é uma empresa que busca resolver um problema de forma rápida, por meio de uma ideia inovadora. Nos últimos anos, vivemos uma explosão de startups; poucas, no entanto, alcançaram a marca de unicórnio, isto é, que alcança uma avaliação de mercado de mais de 1 bilhão de dólares. É por isso que Tibério Praxar, mentor com mais de 28 anos de experiência em consultoria com startups, em contraposição ao termo unicórnio – startups que prometem retornos financeiros altíssimos, mas na prática não conseguem sobreviver –, trouxe termo “camelo”, ou seja, um animal capaz de atravessar as adversidades e as intempéries de um deserto.Tibério Praxar é Sócio Diretor da UNIMENTOR, da Epitychia, da Maduros 60+, Advisor da Aceleradora InovaHub, Me Leva – turismo para família e do UNIHUB. Auditor, consultor, mentor, professor de pós-gradução e autor do livro: “Família, Família, Negócios à parte: Transformando ideias e hábitos mentais em algo útil”.Saiba mais sobre o modelo de startups.
1- Na América Latina, o Brasil costuma ser “a menina dos olhos” para os investidores da nova economia. Como você vê, no cenário atual, as oportunidades das startups brasileiras em atrair investimentos?
O Brasil é, em grande parte, vitrine da América Latina e da América do Sul, por algumas razões, como tamanho populacional, histórico, dentre outros motivos, como também a conjuntura macroeconômica dos nossos vizinhos ao longo das décadas. Outro fator é a veia empreendedora do Brasil.Muitas pessoas empreendem no Brasil por necessidade; eu mesmo fui vendedor de porta em porta por nove anos. A criatividade e a facilidade de comunicação facilitam a atividade do comércio e de algumas ocupações autônomas no país. Por outro lado, mesmo em momentos de desemprego, houve aqui uma circulação econômica que possibilitou que esses empreendedores conseguissem manter seus negócios funcionando.Nos últimos anos, a popularização do acesso a internet proporcionou também que muitas pessoas entrassem no empreendedorismo por algum propósito.Acredito que ainda continuaremos como vitrine da América Latina, pois, infelizmente, nos países vizinhos a conjuntura econômica está pior, e o nível de desemprego está maior. Isso dificulta muito a atividade empreendedora, visto que não há circulação de dinheiro suficiente para manter o giro.
2- A transformação digital foi um grande impulsionador nas ‘valuations’ das startups em crescimento. Como você enxerga esse cenário para quem está no universo das startups?
Nós temos o momento antes da pandemia e do pós-pandemia. No momento antes da pandemia, vivemos uma transformação digital muito aquém do que se esperava, já que não era uma pauta priorizada por muitas empresas.Com a pandemia, observamos um corte muito grande – vimos que muitas empresas faliram, porque não conseguiam contato com o consumidor e não tinham outra opção; outras que poderiam ter passado por uma transformação digital para sobreviver; e outras que conseguiram se adaptar e continuar. Algumas sobreviveram, outras não.No limite, as grandes empresas que conseguiram sobreviver são aquelas que tinham capital de giro e uma marca consolidada.Normalmente, as empresas têm uma reserva ou um planejamento para três meses; praticamente nenhuma delas conta com uma autonomia financeira no período de 1 a 2 anos.Nesse processo de corte da pandemia, que fez com que o mundo todo tivesse que reagir, o tempo de reação e a capacidade de reação diferem de empresa para empresa. Se eu tenho uma empresa com muita transformação digital, mas com pouco tempo, fica difícil sobreviver. Se eu tenho muito tempo de negócio, mas não tenho acesso a tecnologia, fica também difícil de sobreviver.Algumas empresas passaram a viver apenas do digital, só que o mundo offline tem também muito potencial. Não se muda o comportamento de consumo de gerações em dois anos, por mais necessário que isso seja. As pessoas foram para o e-commerce por necessidade, não por escolha. Todas as empresas que souberam aproveitar o momento digital, tiveram bons resultados, mas nem todas se prepararam para o retorno do presencial.Falou-se muito das empresas que não se anteciparam para a era digital, mas não se falou nas que não se preocuparam com o pós-Covid, para era digital com o off-line, em que se volta a viver o mundo normal.O grande problema para as startups, isto é, para as empresas que estão se iniciando e que se propõem a resolver algo, ou uma dor de mercado de forma rápida, foi exatamente este: não se colocaram em condições adequadas para o retorno e, dessa forma, são extremamente dependentes de tecnologia.E o que eu vi durante a pandemia foi: muitas startups usaram a tecnologia como início e fim, e não como meio.No contexto pandêmico, em razão das circunstâncias impostas, as empresas muito tecnológicas tiveram um aumento de sua valuation, porque isso era necessário no momento para sobreviver. Os investidores, por sua vez, não tinham no que alocar seus dinheiro e passaram a investir nessas empresas iniciantes que prometiam mundos e fundos, porque elas estavam inseridas nesse contexto de tecnologia.Durante a pandemia, as startups prometiam taxas de juros bastante atraentes. Mas vale lembrar que risco e promessa de retorno financeiro são proporcionais – quanto maior o risco, maior o retorno prometido.Foram constatados muitos casos de sucesso das startups, mas houve também muitas que deixaram de existir. No mundo temos um total de 800 unicórnios, considerando um recorte temporal de quase 30, se partimos do pressuposto de que o termo “startup” surgiu no fim da década de 1980.Observamos milhões de startups que deram errado e milhares que apenas sobreviveram, e poucas, proporcionalmente, se tornaram unicórnios.Vemos muita publicidade sobre esses casos de sucesso, mas pouco se divulga sobre os que deram errado, dos erros e do que não fazer.
3 - Presenciamos algumas ondas de demissão no cenário de startups, por que isso aconteceu? Esse movimento era previsível ou foi uma surpresa?
Temos informações de startups que demitiram até 80% do seu quadro de funcionários. Esse cenário era esperado se considerarmos que era necessário se planejar para a retomada ao presencial.Além disso, vivemos uma onda de investimentos em startups por investidores que não conheciam muito o operacional e o funcionamento das startups. Por outro lado, foram observadas algumas startups que fizeram queima de caixa de forma irresponsável. Com isso, muitos investidores perceberam que esse cenário não era tão promissor como parecia.Sob outra perspectiva, com o pós-pandemia, outras opções mais atrativas aos investidores surgiram – opções com risco bem menor e retornos relativamente atraentes. Portanto, era de esperar que, com o retorno das atividades econômicas, os investidores teriam outras opções, e de outra ponta, que operação com queimas de caixa e pouca organização para estruturação não seria sustentável.
4 - O que os empreendedores devem trabalhar para mostrar aos investidores que suas ideias resolvem um problema real, que elas serão aceitas e compradas pelo mercado?
O primeiro ponto é entender que não basta uma ideia para ganhar dinheiro. É preciso mostrar para o potencial investidor que essa ideia já está se tornando um produto ou um serviço e que isso funciona. Além disso, é importante transmitir que o seu público-alvo está disposto a pagar por isso, por meio de testes e validação do produto ou serviço.Depois de aprovar o produto, é necessário demonstrar um mínimo de organização de negócios, contábil e jurídica.Para atrair investidores, é imprescindível também ter um plano de negócios organizado, bem estruturado, completo e atualizado.
5 - Em 2022, surgiu o termo “startup camelo”. Você pode contar um pouquinho sobre esse novo conceito e as estratégias por trás desse modelo de startups?
Antes do termo “startup camelo”, já ouvíamos falar das “startups unicórnios''.O unicórnio é um animal que nunca vimos, exótico, mitológico, que se existisse valeria muito. No mundo das startups, é uma empresa que valeria mais de um bilhão de dólares. A probabilidade, no entanto, de se tornar um unicórnio é pequena. Proporcionalmente ao número de startups já criadas e das que chegaram a ultrapassar mais de 1 bilhão de faturamento, é raro se tornar um unicórnio.Com as mudanças de mercado no pós-pandemia, começam a se alterar políticas macroeconômicas (outras opções de investimento no mercado) e um histórico de startups que não deram certo.Os investidores que definem o cenário das startups. E com toda essa conjuntura, percebeu-se que o risco de uma operação de startups era ainda maior do que se havia calculado, que a probabilidade de se ter retornos elevados era, na verdade, menor do que o esperado; afinal, poucas se tornaram unicórnios.Além disso, o mercado disponibiliza opções mais seguras – empresas que estão com um grau de maturidade maior, isto é, que estão no seu segundo ou terceiro ano de existência, que testaram o produto, que não têm uma margem de lucro tão grande, mas que apresentam uma capacidade de sobrevivência grande. É uma empresa que não vai se tornar um unicórnio, mas, por essa capacidade de sobreviver, pode se tornar um camelo.Crescer de forma exponencial, com uma margem menor, mas contínua. O investidor prefere ter uma margem menor e um risco menor.O camelo é um animal do deserto, que consegue se adaptar às intempéries do deserto, como sol e chuva, e ainda assim sobreviver. Ele é capaz de atravessar o deserto sem morrer.
6 - Gostaria de deixar uma mensagem final para quem está no universo de startups?
Para quem é startupeiro: cuidado com o seu mentor. Busque pessoas com conhecimento e vivência com criação, manutenção, crescimento e desenvolvimento de empresas.Para quem é investidor: não invista em ideias, mas em resultados. Todo mundo tem boas ideias. Procure por pessoas que já conseguiram testar a viabilidade do produto, a aceitação do mercado ou a capacidade de se ter alguma margem. Se você quer se aprofundar ainda mais, acesse o conteúdo Tendências para startups e veja quais são as oportunidades para aproveitar as lacunas do mercado. Como vimos, o cenário para a captação de financiamentos para startups tende a ficar um pouco mais desafiador nos próximos anos. É possível que os anos abundantes de financiamento para startups que aconteceram no período pandêmico não se repetirão. Mas, nem por isso serão anos desanimadores, porque isso não significa que não haverão oportunidades.Se você tem alguma ideia ou projeto e gostaria de iniciar uma startup, vale a pena realizar bons planos de negócios, se preparar melhor para as reuniões com potenciais investidores e trabalhar de forma comprometida e consistente. A dica é mostrar profissionalismo e capacidade de execução. Sempre haverá espaço para boas ideias, negócios bem organizados e pessoas competentes!Agora, se você já está no cenário de startups, o conselho é buscar o aprimoramento das habilidades - tanto técnicas, quanto de soft skills. Resiliência e inteligência emocional serão habilidades exigidas neste ambiente. Continuem trabalhando com excelência e otimismo.